A
 CNTE reconhece o esforço da Comissão Especial da Câmara dos Deputados, 
encarregada em analisar o PL 8.035/10, no sentido de negociar com a 
sociedade as metas propostas pelo Poder Executivo ao Plano Nacional de 
Educação, porém o atraso na leitura do substitutivo do relator expôs 
limitações de diálogo entre a Comissão e o Governo Federal, situação que
 poderá comprometer a votação do PNE, neste ano de 2011, ou mesmo 
inviabilizar avanços reivindicados pela sociedade.
Sobre
 o mérito do substitutivo, protocolado dia 5/12, não há dúvida de que o 
relator foi sensível em atender várias propostas da sociedade, muitas 
consubstanciadas nas deliberações da Conae 2010. Contudo, a estrutura do
 documento ainda não permite garantir mudanças substanciais nas 
políticas públicas educacionais, com vistas a atingir um projeto de 
educação nacional, com qualidade e equidade, sobretudo em razão de 
omissões na área do financiamento público e da perspectiva de construção
 do sistema nacional de educação.
Financiamento
Uma
 das principais deficiências do PNE permanece nesta questão. Embora o 
substitutivo tenha absorvido o conceito de Custo Aluno Qualidade e 
fixado prazo de dois anos para sua regulamentação – sob acompanhamento 
do Conselho e do Fórum Nacional de Educação –, a falta de critério para 
seu financiamento efetivo não permite determinar, por exemplo, qual a 
parcela de responsabilidade do Governo Federal, e também de Estados e 
Municípios, perante o percentual do PIB a ser destinado à educação 
nacional (sobretudo a pública). Em suma: os planos plurianuais e os 
orçamentos dos entes federados permanecem sem orientação para atingir 
com qualidade as metas do PNE e dos planos locais que se sucederão. 
Igualmente, não é possível saber de onde sairão os recursos para se 
elevar o percentual do PIB para a educação.
A
 proposta do relator não contempla o percentual defendido pela sociedade
 de 10% do PIB para investimento na educação. Estão previstos 8%, até o 
final da década (aumento de 0,3% ao ano), o que é insuficiente, ainda 
mais contabilizando-se os repasses do Poder Público à iniciativa 
privada, como as bolsas do Prouni e do Pronatec. A proposta da Conae 
prevê aumentar anualmente em 1% a porcentagem do PIB, com investimento 
exclusivo na educação pública. Ademais, o relator indicou como verbas 
extras para a educação apenas os recursos provenientes do Fundo Social 
do Pré-sal e dos royalties do petróleo e demais minerais, sem indicar o 
percentual mínimo dessas receitas, tampouco outras fontes financeiras 
necessárias para garantir, além da universalização do acesso e a 
qualidade no nível básico, as metas de expansão da educação superior 
pública (graduação e pós-graduação).
.
Sistema Nacional de Educação
As
 incongruências ainda existentes na meta 20 (financiamento) – que a CNTE
 considera vícios de origem do PL 8.035/10, pois o governo optou em não 
adentrar na questão, sobretudo em âmbito da reforma tributária – omitem o
 importante debate sobre a construção do Sistema Nacional de Educação (SNE).
 Sem fontes seguras de financiamento, que expressem o compromisso do 
Estado brasileiro para com a educação, permanece a lógica do regime de 
colaboração que submete estados, municípios e o DF às políticas do 
Governo Federal – hoje expressas nos Planos de Ações Articuladas e nas 
metas do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Ou seja: o plano 
reforça a postura concentradora da União frente a uma desejável visão 
republicana.
Conforme
 destacado na primeira avaliação da CNTE sobre o PL 8.035/10 (fevereiro 
de 2010), a qualidade educacional (com equidade) prescinde de uma 
estrutura organizativa e de financiamento que seja capaz de comprometer 
os entes da federação, indistintamente, mesmo à luz da descentralização 
dos sistemas de ensino. Ao não estabelecer mecanismos de financiamento 
cooperativo (institucionalizado) para o atendimento das metas, o PNE 
continua apostando na benevolência dos gestores públicos, cujo 
resultado, até hoje, mostrou-se incapaz de superar as contradições 
tributárias ou as disputas políticas sobre o papel da educação para a 
construção de uma sociedade justa e igualitária.
Ademais,
 o SNE teria ainda por objetivo induzir e acompanhar a regulação do 
setor privado frente às metas do(s) Plano(s) de Educação, tema que se 
encontra aberto em todas as metas de acesso aos níveis, etapas e 
modalidades da educação, inclusive nas que tratam da formação dos 
profissionais da educação e do percentual de investimento do PIB no 
setor.
Controle Social
Importante
 registrar que as emendas acatadas pelo relator com o objetivo de 
estabelecer prazos intermediários a quase todas as metas – com exceção 
do financiamento e de algumas outras –, tende a facilitar o 
acompanhamento social e institucional do Plano nas unidades da 
federação.
Destaca-se,
 também, a inclusão da estratégia 20.4, que trata da divulgação 
periódica das receitas e despesas dos entes públicos, através de mídia 
eletrônica, e incentiva a participação popular nos processos de elaboração e discussão dos planos, leis de diretrizes orçamentárias e orçamentos.
Em
 outra frente de luta envolvendo o controle social, a CNTE tem 
acompanhado a tramitação do PL 8.039/10, que visa aprovar a Lei de 
Responsabilidade Educacional. O projeto enviado pelo Governo ao 
Congresso possui abrangência restrita à Lei da Ação Civil Pública (de 
caráter patrimonial), porém encontra-se apensado a outras duas propostas
 que visam tipificar condutas de gestores e educadores em âmbito do 
Estatuto da Criança e do Adolescente e da própria legislação em comento.
 Na avaliação da CNTE, os três projetos, além de outros tantos já 
protocolados em diversas ocasiões no Congresso, merecem um amplo debate 
com todos os atores da educação, a fim de atender aos objetivos centrais
 da proposição.
Acesso e permanência
O
 substitutivo mantém a limitação de atendimento às creches em 50% até o 
final da década e incentiva a expansão das vagas em creches conveniadas 
(estratégia 1.7). As demais etapas da educação básica encontram-se 
sintonizadas com a meta estabelecida pela Emenda Constitucional nº 59, 
de universalização das matrículas até 2016. 
Quanto
 aos ensinos fundamental e médio, as principais metas consistem no 
aumento das projeções de concluintes dessas etapas e de frequência entre
 os estudantes em idade regular (6 a 14 anos e 15 a 17 anos, 
respectivamente). O aumento da escolaridade da população de 18 a 29 anos
 também deverá saltar de 9 para 12 anos entre o quinto e o décimo ano de
 vigência do PNE.
A
 educação profissional técnica de nível médio conta com a expectativa de
 triplicar as vagas, devendo 50% concentrar-se no setor público. A 
medida é importante para limitar o avanço das matrículas na rede 
privada, que são financiadas em grande parte com recursos públicos.
Para
 as universidades públicas, o substitutivo prevê aumento de 40% na 
oferta das vagas em cursos de graduação, com suporte a programas 
especiais de assistência estudantil. As pós-graduações (mestrado e 
doutorado) também foram contempladas com percentuais mais elevados de 
atendimento que os propostos originalmente pelo Executivo.
Gestão Democrática
No
 tocante à gestão democrática, o relator contemplou boa parte das 
emendas propostas pela sociedade, em particular pela CNTE, sobretudo em 
três aspectos:
1. Sobre o Fórum Nacional de Educação,
 o parecer amplia as atribuições dessa instância, inclusive acerca da 
competência para analisar e propor a revisão do percentual de 
investimento do PIB em educação, que ficará, em última instância, a 
cargo do Congresso Nacional.
2. Quanto ao processo democrático de construção dos planos estaduais e municipais de educação,
 o substitutivo indica a participação das comunidades escolares, de 
trabalhadores da educação, de estudantes, de pesquisadores, de gestores e
 de organizações da sociedade civil no processo de formulação das leis 
locais.
3. Especificamente sobre a meta 19,
 o parecer estabelece prazo de dois anos para estados, municípios e DF 
criarem leis que regulamentem a gestão democrática. As mesmas devem 
observar a participação da comunidade escolar no processo de escolha 
(eleição) de diretores. Não obstante a contemplação de propostas da 
CNTE, o parecer mantém a indicação de critérios técnicos de mérito e 
desempenho para a nomeação das direções escolares, o que, infelizmente, 
dá margem à gestão empresarial na educação. Outros destaques do 
substitutivo: i) prioriza os repasses voluntários da União para os entes
 que regulamentarem a gestão democrática; ii) recomenda ampla oferta 
pública de formação para os conselheiros do Fundeb, da Merenda e de 
outros colegiados voltados ao controle social e ao acompanhamento das 
políticas públicas educacionais; iii) incentiva a constituição de Fóruns  Permanentes
 de Educação nos entes federados, a fim de coordenar as conferências de 
educação e de monitorar a execução do PNE e dos planos locais de 
educação; iv) estimula a constituição de grêmios estudantis e a 
constituição e fortalecimentos dos conselhos escolares e de conselhos de
 educação nos municípios, este último de caráter fiscalizador e com 
funcionamento autônomo; v) induz a construção democrática dos projetos 
político-pedagógicos das escolas, bem como dos currículos escolares, dos
 planos de gestão escolar e dos regimentos escolares por meio de 
profissionais, alunos e familiares.
Valorização Profissional
Com
 relação à valorização dos profissionais da educação básica, as 
principais metas e estratégias do Plano trataram de adequar as 
nomenclaturas dos profissionais à LDB, contemplando os funcionários da 
educação. 
Sobre a carreira (meta 18),
 o parecer agrega várias propostas da CNTE, sobretudo a que prevê o PSPN
 para todos os profissionais da educação (art. 206, VIII da CF). O prazo
 de dois anos para constituir os planos de carreira estaduais e 
municipais, por um lado, no que concerne ao magistério, contraria 
dispositivo da lei do piso; porém, com relação aos funcionários 
constitui avanço que engloba a regulamentação do piso salarial amplo. 
Outros pontos contemplados pelo substitutivo: i) licença remunerada para
 qualificação profissional; ii) inclusão dos cursos tecnológicos 
(funcionários) no rol da formação profissional; iii) estímulo à 
constituição de comissões permanentes de profissionais da educação, nos 
entes federados, para subsidiar a implantação dos planos de carreira, 
além de outras questões abordadas pelo projeto original.
No que tange à formação profissional (meta 16),
 embora o substitutivo contemple todos os trabalhadores da educação, 
conforme propôs a CNTE, apenas os professores contam com meta 
quantitativa a ser alcançada até o fim da década – embora seja preciso 
adequá-la ao art. 62, §
 3º da Lei 9.394 (LDB), que dá preferência à formação inicial de caráter
 presencial. Falta, no entanto, estabelecer percentuais de atendimento 
em relação à escolaridade e à profissionalização dos funcionários da 
educação, bem como indicar as fontes de financiamento dessa política 
pública. Frise-se que a previsão de bolsas de estudos para pós-graduação
 contempla professores e demais profissionais.
Quanto à remuneração do magistério (meta 17),
 o substitutivo prevê equiparar o rendimento médio dos professores com 
de outros profissionais de escolaridade equivalente. Até o sexto ano de 
vigência do PNE (o que é muito tempo!) a remuneração deve atingir 85% da
 média remuneratória dos demais profissionais e até o final da década 
deverá, no mínimo, ser totalmente equiparada. Hoje, a remuneração média 
do magistério equivale a 60% da dos profissionais em atividade nos 
diferentes setores produtivos do país. 
O
 maior “pecado”, contudo, da meta 17 do PNE consiste em não vincular a 
previsão mínima do piso salarial profissional nacional do magistério aos
 vencimentos iniciais das carreiras, nos estados e municípios, conforme 
determina a Lei 11.738. E esperamos corrigir essa incoerência através de
 emendas ao substitutivo do relator Vanhoni. 
Importante
 registrar que esse compromisso do PNE corre sério risco de ser 
considerado natimorto no caso de a Câmara dos Deputados confirmar a 
votação da Comissão de Finanças e Tributação da Casa, que atrelou única e
 exclusivamente o reajuste do piso do magistério à correção 
inflacionária do INPC/IBGE. Em sendo o piso a principal política de 
valorização e estímulo ao cumprimento da meta 17, seu “congelamento” 
inviabilizará qualquer tentativa de equiparação da remuneração média do 
magistério com outras profissões.
Avaliação da Educação
O
 substitutivo conserva a lógica dos testes nacionais e do Ideb na 
estrutura do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. 
Retirou-se do texto original a perspectiva de o INEP empreender “estudos
 para desenvolver outros indicadores de qualidade relativos ao corpo 
docente e à infraestutura das escolas de educação básica”, o que é um 
retrocesso. O substitutivo do relator apenas aponta ao INEP a 
necessidade de fornecer novos indicadores (mais amplos) sobre a 
avaliação institucional, mas não induz a transformação do Ideb. Assim, 
permanece a educação brasileira condicionada a uma abordagem da 
pedagogia das competências, a qual se sustenta em currículos mínimos e 
na omissão de fatores sociais que determinam a qualidade educacional, a 
exemplo do perfil socioeconômico dos estudantes; da formação, salário, 
carreira e condições de trabalho dos profissionais da educação; da 
relação professor/aluno em sala de aula; da infraestrutura das escolas e
 dos recursos pedagógicos disponíveis à aprendizagem; do processo de 
gestão democrática, dentre outros.
Sobre
 os resultados dos testes, o parecer mantém a lógica de restrição dos 
resultados individuais (por aluno, turma, escola e rede de ensino) às 
escolas e às redes de ensino, numa tentativa de evitar sua publicização 
por ranking.
Em
 breve, a CNTE divulgará as emendas que proporá à Comissão Especial do 
PNE, com o objetivo de contemplar questões relevantes que deixaram de 
ser atendidas nesta primeira versão de substitutivo da Câmara dos 
Deputados.
Brasília, 6 de dezembro de 2011
 
 
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