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segunda-feira, 13 de junho de 2011

O BURACO É AQUI EMBAIXO

Por Ramon Casa Vilarino, Historiador e pesquisador do Núcleo de Estudos de Ideologias e lutas sociais (NEIL/PUC-SP).
A distância entre os ricos e pobres na América Latina, região com os mais elevados índices de desigualdade do planeta, condena milhões de pessoas à pobreza.
As desigualdades de renda, acesso a serviços, educação e poder da América Latina são mais altas do que qualquer região do mundo. Apenas algumas sociedades na África conseguem ser mais desiguais do que países latino-americanos. Essas elevadas taxas de desigualdade têm um custo alto: aumentam a pobreza, dificultam o crescimento econômico e diminuem seus impactos na redução da pobreza. Por isso, o tema desigualdade é central no debate político da região. A pobreza na América Latina seria fruto da desigualdade? E a desigualdade, qual seria a sua causa? é possível haver desigualdade sem pobreza? As respostas a essas questões nos remetem diretamente ao estudo do sistema capitalista, das formações sociais latino-americanas e da colonização empreendida em nosso continente.

CAPITALISMO, OU DESIGUALDADE COMO PRESSUPOSTO
O capitalismo é um modo de produção que possui princípios, dentre os quais se destacam o respeito e a desfesa da propriedade privada dos meios de produção e igualdade jurídica entre todos os atores sociais para realizar contratos livremente. O que isso significa? Em princípio qualquer pessoa pode tornar-se um proprietário de meios de produção e a lei é igual para que todos possam competir em condições de igualdade. Imagine se um proprietário de meios de produção, na prática, é igual a um trabalhador desempregado necessitando de renda! Quando eles se encontram e assinam um contrato, o primeiro comprando e o segundo vendendo sua força de trabalho, temos o encontro de dois atores desiguais, e nessa relação o trabalhador se verá quase na obrigação de aceitar a proposta deste ou de outro propietário. Assim, do ponto de vista capitalista, nunca uma vaga de emprego é criada se não houver a possiblidade de se extrair lucro dessa relação com o trabalhador, do que se depreende que a desigualdade é inerente ao sistema.
E a pobreza? Deriva da desigualdade? Podemos ser desiguais socialmente, mas não termos pobreza entre nós. O que impede que isso se concretize é que o capitalismo pressupõe a acumulção de capital o tempo todo. Essa é a condição para que o capitalista invista na produção e empregue alguém. Dessa forma, na busca incessante por esse objetivo, o lucro é obtido pelo maior preço possível da mercadoria produzida somada à maior economia possível em sua produção. O que acontece então? O capitalista procura vender sua produção - sua, não porque produziu, mas porque se apropriou da riqueza gerada pelo trabalho - pelo maior valor e pagar à mão de obra o menor valor. O que temos como resultado? No limite, riqueza de um lado e pobreza de outro.
Essa é a única causa da desigualdade e da pobreza na América Latina? Certamente, não, mas no sistema capitalista haverá em maior ou menor grau essa combinação, do contrário, o país mais rico do mundo, que econsome 40% dos recursos naturais do planeta para apenas 5% da população da população do globo , não teria pobres. E não são poucos. No caso da América Latina há outras causas associadas, como a colonização e seus reflexos ainda hoje.

 COLONIZAÇÃO LATINA
A colonização empreendida na América Latina fez parte do processo de expansão europeia, iniciado no século XV por Portugal e Espanha. Quando resolveram cruzar o Atlântico, os ibéricos esperavam encontrar regiões que pudessem ser facilmente exploradas do ponto de vista mercantil. Não à toa, nos primeiros anos após a chegada ao Brasil, o governo português arrendou sua exploração a comerciantes que se interessavam pelo pau-brasil, ao passo que os espanhóis tiveram melhor sorte e exploraram de cara metais preciosos. A Espanha tornou-se a maior potência da época por isso. Qual o custo disso tudo? Muito grande, particularmente o genocídio das populações nativas, sacrificadas como lenha para atender àqueles interesses. No Brasil, além dos indígenas, milhões de africanos foram barbaramente escravizados e mortos nesse regime que fazia um trabalhador definhar até a morte, em muitos casos, após sete anos de trabalho.
Quando a escravidão finalmente foi abolida, o que aconteceu? Por aqui, os negros foram largados à própria sorte, impedidos de integrar com algum êxito o sistema que no fim do século XIX por aqui dava as caras. Nesse sentido, além de afirmarmos no tópico acima, há esse reforço explicativo: a pobreza se concentra em populções que foram espoliadas de seu modo natural de vida e que tiveram de se integrar, negros e índios, sem nenhuma alternativa, como cidadãos de segunda classe numa formação socioeconômica que anuncia que perante a lei todos são iguais. Assim, negros e descendentes de índios num continente como o nosso são particularmente marginalizados, num sistema maior que pressupõe a desigualdade como natural e até necessária, pois, como afirmam os autores neoliberais, há a complementeridade de funções, ou seja, é necessário que alguns façam o que outros não estão dispostos a fazer.
Os povos originários pré-colombianos e os africanos para cá arrancados não possuem muito espaço e condições objetivas para retomar seus modos de vida ancestrais, que, no caso de muitas tribos, não só a pobreza, mas mesmo as desigualdades não existiam.

A POBREZA DO PONTO DE VISTA DOS REFORMISTAS
Estudos recentes têm mostrado que para diminuir a pobreza na América Latina são necessários investimentos nas áreas sociais e em setores estratégicos. A educação é um deles. As pesquisas apontam que a cada ano estudado sobem as perspectivas de ascensão social e aumentam as chances reais de emprego e renda. No entanto, filhos de pais que possuem baixa escolaridade têm mais chances de se evadir da escola e ocupar postos de trabalho informais, o que alimenta um novo ciclo de pobreza. Além disso, morando em áreas pouco atendidas por serviços de saúde e saneamento básico, o risco de doenças também aumenta, fazendo com que trabalhadores com baixa escolaridade adoeçam mais e produzam menos, tenham menos renda, estudem menos, tirem seus filhos mais cedo da escola, estejam mais expostos à violência, e assim por diante.
Considerar, no entanto, que a educação por si só resolveria o poroblema, ainda que a longo prazo, é um otimismo ingênuo. Os próprios autores dos estudos apontam como necessárias reformas como a agrária, ampliando o leque de propriedades e desconcentrando a produção e a posse da terra. Isso, por exemplo, diminuiria a população das grandes cidades e os gargalos existentes em torno de serviços públicos. O combate à corrupção e o estímulo à participação dos negócios públicos por parte da população são outras frentes necessárias para que aquele objetivo seja atingindo. Além disso, é preciso que os Estados atuem firme e decididamente no controle do sistema, em sua regulação e na taxação de grandes riquezas, cujo o outro lado da moeda chamas-se miséria. Como fazer isso, no entanto, quando o discurso neoliberal e "moderno" insiste no oposto, afastamento do Estado dos campos social e econômico, como se nada de político existisse neles?
Os estudiosos desse campo apontam como as causas da pobreza as consequências do capitalismo, e não este em si. Daí defenderem reformas no sistema, e não o seu fim.
Dentro dos marcos do capitalismo, a desigualdade continuará existindo, isso é inevitável dada a natureza dos sistema. Podemos discutir, então, se apobreza não pode ser extinta ou, pelo menos, abrandada. Programas sociais, como o Bolsa Família, atenuam de alguma forma a miséria, porém, esse tipo de ajuda sem o necessário desenvolvimento social cria uma rede de pessoas completamente dependentes do Estado, o que estimula as práticas clientelistas e populistas de se fazer política. Enquanto não se aliar crescimento econômico com desenvolvimento social, continuaremos assistindo a esse triste filme: riqueza acumulada de um lado, miséria e pobreza distribuídas do outro.


Fonte: Revista Carta na Escola, Edição n° 48, agsoto de 2010
Fonte das imagens:
www.merionline.com.br
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